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Recomendação aponta que as presas devem ter opção de escolha entre custódia no presídio feminino ou no masculino. Portão de entrada do Complexo Penitenciário Silvio Hall de Moura (Crashm) em Santarém
Adonias Silva/G1
O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a autoridades do Pará, nesta terça-feira (25), medidas para garantir direitos de mulheres transexuais e travestis que estejam cumprindo pena no Centro de Recuperação Agrícola Silvio Hall de Moura (Crashm), unidade de custódia e reinserção em Santarém, no oeste paraense, destinada exclusivamente a apenados do gênero masculino.
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Assinado pelo procurador da República Vítor Vieira Alves, o documento foi enviado ao secretário de administração penitenciária do Pará, Marco Antonio Sirotheau Corrêa Rodrigues, e ao diretor do Crashm.
Foi fixado o prazo de dez dias para que a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) e o CRASHM informem sobre o acatamento da recomendação apresentando documentos que comprovem as providências que foram adotadas. Eventual ausência de resposta será interpretada como recusa de seu atendimento.
O g1 fez contato com a Seap e aguarda posicionamento.
Direito de escolha
A recomendação do MPF aponta a necessidade de que seja realizada a identificação de todas as mulheres transexuais ou travestis que estejam cumprindo pena na unidade, para que possam exercer seu direito de escolha de cumprir pena na Unidade de Custódia e Reinserção Feminino (UCRF) de Santarém, independente de decisão judicial específica.
Também foi recomendada a imediata transferência, para a UCRF, de uma detenta transexual que já manifestou interesse em cumprir a pena no presídio feminino. Segundo relatos de detentas transexuais ao MPF e à Defensoria Pública da União (DPU), elas sofrem frequentes episódios de desrespeito à identidade de gênero pelos demais internos e pelos próprios agentes da Polícia Penal.
“A presente recomendação busca resguardar não apenas integridade física das pessoas trans e travestis privadas de liberdade, mas também a integridade psíquica e saúde mental, impactada pelo desrespeito do próprio Estado à sua identidade de gênero e pela pela permanência em um ambiente cujas chances de violência motivada pelo gênero são comprovadamente maiores”, destaca o MPF.
Apesar de notificada pelo MPF, a Seap não comprovou a existência de celas ou alas específicas para pessoas LGBTQIA+ no CRASHM.
Tratamento cruel
O MPF aponta que a permanência de mulheres trans e travestis em presídios masculinos configura tratamento cruel, desumano e degradante. A recomendação se fundamenta em diversos dispositivos legais e normativos, como a Constituição Federal, a Resolução nº 348 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os Princípios de Yogyakarta e a Convenção Interamericana Contra o Racismo e a Discriminação.
O MPF ressalta que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, firmou o entendimento de que o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis, de modo que os casos de homofobia e/ou transfobia devem ser enquadrados como crime de racismo.
O documento enviado pelo MPF também enfatiza que as diretrizes da Resolução nº 348 do CNJ “se aplicam, com ainda mais razão, à administração pública penitenciária, que deve respeitar a identidade de gênero da pessoa privada de liberdade e oportunizar a ela o direito de preferência pela custódia em unidade feminina ou masculina, ainda que o judiciário não tenha cumprido as determinações do CNJ no processo penal ou no processo de execução”.
A resolução do CNJ garante às pessoas privadas de liberdade o direito de participação em decisões relacionadas ao local de detenção adequado à sua orientação sexual e identidade de gênero.
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