Com show marcado em Volta Redonda neste domingo, rapper foi entrevistado pelo g1 e explicou inspirações para criação de disco que traz mito grego sob uma perspectiva contemporânea. Um dos grandes nomes do hip-hop brasileiro, o rapper BK’ se apresenta em Volta Redonda (RJ) neste domingo (27). O show será realizado na Biblioteca Municipal Raul de Laoni, no bairro Vila Santa Cecília, a partir das 16h. A entrada é gratuita.
O evento marca a festa de encerramento do Mês da Juventude na cidade, uma ação organizada pela prefeitura que promoveu uma série de manifestações culturais em agosto voltada para o público jovem.
Em entrevista exclusiva ao g1, o artista revelou que terá um setlist recheado de músicas do álbum Icarus, assim como tem feito nos shows da turnê do disco, mas também prometeu cantar clássicos que marcaram sua carreira.
Mesmo a gente não levando toda estrutura de Icarus, o show atual é no universo do álbum, realmente para trazer a experiência do álbum de alguma forma. Tem algumas músicas que ficam de fora, mas a gente traz Castelos & Ruínas, Gigantes, O Líder em Movimento e músicas dos EPs também
Além do cantor carioca, o evento terá batalha de rima e apresentações dos rappers THG, Greggório e Natache Discotecagem e dos DJs Josafá e Dirty Death.
Icarus: o mito grego na sociedade atual
Capa do álbum ‘Icarus’, de BK
Divulgação
A dois meses de completar um ano de lançamento, Icarus é o quarto disco de estúdio do rapper carioca, em edição do selo fonográfico Gigantes, aberto pelo artista em maio de 2021, ano que lançou o EP Cidade do Pecado.
No álbum, BK’ aborda o mito de Ícaro, cuja reflexão é sobre os desejos humanos e as consequências da ambição sem fim. A mitologia grega é contextualizada em uma perspectiva contemporânea e urbana ao longo de 13 faixas em que aparecem as participações especiais de Major RD, L7NNON, Julia Mestre, Bebé, Luccas Carlos e Marina Sena.
“Icarus chegou na metade do álbum, ele não foi construído ao redor do mito. O álbum ia se chamar Luzes da Cidade, mas durante os nossos estudos, o que eu gostaria de falar no Luzes da Cidade era exatamente o mito de Ícaro. As luzes, o sol… Como aquilo vai te seduzindo, o quanto você quer estar perto das luzes, o quanto você quer conquistar as coisas. O mito e o álbum se encontram nas tentativas de fuga do labirinto. Que asas nós vamos criar para fugir do labirinto? Tem vários labirintos dentro do álbum, tem o labirinto do relacionamento, da guerra urbana, do racismo… São várias asas que a gente vai criando para conseguir sair de dentro desses labirintos. Mas essa fuga também não pode se deixar levar demais, sem ser muito seduzido pelo sol, mas também sem voar baixo demais para não acabar se afogando no mar”, explicou BK’.
Resumidamente, a história do mito consiste na fuga de Ícaro do labirinto do Minotauro junto com seu pai, Dédalo. Para fugir, Dédalo construiu dois pares de asas. Ícaro desobedeceu seu pai durante a fuga e se aproximou do sol, o que danificou o item e o fez cair no mar, levando-o a morte.
O ato de desobediência de Ícaro a seu pai serviu de inspiração para BK’ compor Continuação de um Sonho, música que destaca a importância da ancestralidade e de reverenciar e respeitar os mais velhos da família.
” No mito, o pai dá um conselho e ele [Ícaro] não escuta o papo e acaba morrendo. Continuação de Um Sonho não quer dizer que é pra seguir na risca tudo que seus pais falam, mas a gente escuta e vai aprendendo. Principalmente quem vem de um ‘rolé’ de militante, como minha mãe, que é do Movimento de Mulheres Negras há muitos anos, então a gente vai ouvindo e aprendendo certas coisas. É importante a gente ter o nosso próprio olhar e saber transformar aquilo. Você pegar o que faz sentido pra você e botar isso na sua vida. Essa música vale muito como isso também. O que eu aprendi com minha mãe, o que, de fato, vai desdobrar na minha vida em algo. Continuação de Um Sonho, de certa forma, é tudo que eles [pais] trouxeram pra nossa vida”, afirmou.
Identidade visual de Icarus, disco de BK’
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A narrativa do álbum foi construída a partir do ego, insegurança e medo, explorando diferentes perspectivas. Algo que poucos sabem é que uma das faixas foi sobre uma insegurança pessoal. Segundo BK’, Carta Aberta foi uma composição feita para si mesmo durante um raro momento de bloqueio criativo do rapper.
“Carta Aberta é uma track que fiz pra mim, num momento que eu estava desacreditado. Estava com um bloqueio, não conseguia escrever nada, aí comecei a duvidar de mim mesmo e pensei em fazer uma música sobre isso”, revelou.
A ideia, até então, era encerrar o disco com Carta Aberta em tom de esperança. Para BK’, uma escolha previsível. Por intuição, o artista resolveu mudar de última hora e finalizar Icarus com Amanhecer, com uma proposta de deixar renovação como uma mensagem final.
“Eu ia terminar o [disco] com Carta Aberta, mas seria um final meio que previsível, até pelo tom da música. Acho que Amanhecer dá um sabor de continuidade, de que alguma coisa ainda vai acontecer, como se tivesse algo renovando. Pra escolher a ordem das músicas tem um ‘rolé’ da técnica, mas é bom você ouvir sua intuição também. Arte é muita intuição também”, avaliou.
Virou obra de arte
Obra de BK’ inspirada em ‘O Voo de Ícaro’ foi exposta em museu do Rio
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Mais que apenas música, Icarus virou quadro nas mãos do artista carioca Nikolas Demurtas. BK’ ganhou asas de anjo em uma reinterpretação da tela de “O Voo de Ícaro”, pintada por Jacob Peter Gowy (1636 – 1638).
A obra de arte foi exposta no Museu de Arte do Rio, em uma ação paralela ao lançamento do álbum, no ano passado. O evento reuniu centenas de jovens, que tiveram oportunidade de conferir o quadro em uma ativação de realidade aumentada.
A identidade visual do disco rendeu um prêmio de bronze no Festival Internacional de Criatividade Cannes Lions, na França – considerado o maior da indústria criativa de mídia, comunicação e publicidade.
Desejo de novo feat com Mano Brown
Rappers Mano Brown, Rael, Emicida, Rincon Sapiência, BK e Djonga com o produtor Devasto
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BK’ e Mano Brown juntos já aconteceu. O single O céu é o limite , lançado em 2018, reuniu um time pesado do rap nacional. Além dos dois rappers, Rael, Rincon Sapiência e Djonga também participaram da música.
Desta vez, porém, BK’ imagina uma nova parceria com a lenda do Racionais MC’s em uma música com “sua cara”, como o próprio afirmou. O artista também já se imaginou cantando com Péricles e Djavan, ícones da música brasileira.
“Tenho vontade de fazer com o Mano Brown. Aquele feat (O Céu É o Limite) foi muito maneiro, mas quero entregar uma música com cara de BK’. Tenho muita vontade de fazer com Djavan e Péricles também. O maneiro seria criar algo fora da caixa, por exemplo, um love song com Péricles iria dar infinitamente certo, mas eu tentaria ir por outro caminho também. Assim como foi com a Marina Sena, a gente poderia puxar a música mais para o lado sensual, uma parada que a galera já ia esperar, mas seguimos por outro caminho e quando saiu Se Eu Não Lembrar impressionou muita gente. Sair um pouco do óbvio é bacana, é desafiador”, projetou.
Veja outras respostas de BK’:
Música favorita
“Cada música pesa de uma forma e tem um significado diferente em determinado momento da vida. Um dia de Chuva Qualquer já foi a minha favorita, Espere, Antes dos Gigantes Chegarem… Atualmente, gosto muito de cantar Luzes, acho que ela representa bem o momento atual de um homem preto vivendo no Rio de Janeiro”.
Feat preferido
Vou listar alguns: Antes dos Gigantes Chegarem, mesmo com Luccas Carlos e Juyè não cantando diretamente, a música traz uma combinação muito boa. Tem Quadros, com Luccas Carlos e Ashira, os dois escreveram suas partes, muito maneiro quando os três estão inspirados. Planos, também com Luccas Carlos, um love song que toca muito desde 2018. Não tem como não citar, um hit que conseguiu atravessar os anos, está indo muito bem ainda. Acredito que ainda vou ficar mais uns dois anos cantando Planos com a galera pedindo da mesma forma que pede”.
Público-alvo
“O rap é muito da vivência, do que a gente está sentindo no momento. Desde quando comecei a escrever até o atual momento, eu estava entre 20 e 30 e poucos anos. Então, acho que a gente acaba dialogando mais com esse público por estar vivendo as mesmas coisas. Talvez, daqui alguns anos, eu esteja me expressando musicalmente de outra forma. No momento, estou com 34 anos, sou jovem ainda, quero criar muita coisa e tenho muita fome de conhecimento”.
O que toca no seu fone?
“Eu gosto de ouvir Jay-Z, A$AP Rocky, Tyler The Creator, Kendrick Lamar. No Brasil, gosto de escutar Don L e Racionais Mc’s, que já é ‘de lei’. Sain, o disco novo dele (Ktt Zoo), é um dos melhores trabalhos que eu vi no ano. Rima, beat, a identidade da parada… Eu amo o Sain de coração, ele foi um dos que mais me ajudou no começo, gosto até de falar que o Sain é meu padrinho. E vendo ele conseguindo atingir essa maturidade no trabalho, coisa que ele sempre quis fazer, o ‘rolé’ mais do Boom Bap… Vendo ele conseguir entregar esse super trabalho, fico muito feliz”.
Rotina de compositor
“Todo dia eu escrevo alguma coisa, inspiração e criatividade é exercício também. Então, você tem que estar todo dia ali exercitando para ir se aproximando e chegar no ponto que você quer para trabalhar em cima de uma música”.
Álbum novo em 2024?
“Ainda não estou me pressionando para fazer, sempre quando acabava um álbum eu já me pressionava. A partir de Gigantes, eu terminava o disco já pensando no próximo. Icarus foi meu primeiro projeto que eu termino não pensando em outro disco. Em 2023, a gente ainda vai soltar umas tracks, vai sair o mixtape da Gigantes (selo fonográfico do BK’), não estarei rimando em todas as faixas, mas vai ter JXNV$ rimando e beat de amigos próximos. Mas assim, projeto de um novo álbum, conceito, ainda não tem. Se eu disser que eu não estou rabiscando nada, estarei mentindo, mas não tenho essa pressão de ter que entregar algo para o ano que vem. Se ficar pronto em 2024, eu vou lançar. Se não ficar, tudo bem”.
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VÍDEOS: as notícias que foram ao ar na TV Rio Sul
BK’ discorre sobre álbum ‘Icarus’ e revela desejo de fazer nova parceria com Mano Brown: ‘Uma música com minha cara’
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