Pejotização suspensa? Entenda o que muda com as ações trabalhistas após decisão do STF

Decisão do STF impacta na tramitação de ações trabalhistas em curso em todo o país - Foto: Reprodução/ND

Decisão do STF impacta na tramitação de ações trabalhistas em curso em todo o país – Foto: Reprodução/ND

Os processos trabalhistas que envolvem a chamada “pejotização” das relações de emprego estão com a tramitação suspensa no Brasil. A decisão, despachada pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes nesta segunda-feira (14), é válida até que um julgamento em definitivo sobre a questão seja feito.

A questão será analisada com repercussão geral, o que significa que o resultado deverá ser seguido por todos os tribunais que julgarem os processos. O ND Mais conversou com um especialista em direito trabalhista para entender os impactos da decisão de Gilmar Mendes para os trabalhadores com processos em curso e as perspectivas sobre o futuro do tema.

Por que a pejotização é assunto no STF

No despacho, Gilmar destacou que a controvérsia “tem gerado um aumento expressivo do volume de processos que tem chegado ao STF, especialmente por intermédio de reclamações constitucionais”. Em 2024, a Corte recebeu mais de 2 milhões de novos processos de ações trabalhistas desse tipo, o que representa um recorde desde a aprovação da reforma trabalhista em 2017.

Segundo Gilmar Mendes, crescente número de ações trabalhistas no STF por conta de dissidências com a Justiça do Trabalho exige um julgamento definitivo sobre o tema - Foto: Carlos Moura/STF/Reprodução/ND

Segundo Gilmar Mendes, crescente número de ações trabalhistas no STF por conta de dissidências com a Justiça do Trabalho exige um julgamento definitivo sobre o tema – Foto: Carlos Moura/STF/Reprodução/ND

O tema tem causado atritos entre o STF e a Justiça do Trabalho. Juízes trabalhistas vêm reconhecendo vínculo empregatício de PJs, com a consequente condenação das empresas contratantes a arcar com as obrigações da CLT. Para parte da Justiça do Trabalho, esses contratos são usados para mascarar a relação de emprego, e por isso haveria fraude.

O STF, por sua vez, tem derrubado essas decisões sob a justificativa de que a Corte já permitiu a terceirização das atividades-fim das empresas em 2018. Para a maioria do Tribunal, a Constituição admite contratos de trabalho alternativos à CLT, dando razão às empresas nas ações trabalhistas.

Por que empresas têm escolhido a contratação PJ ao invés de CLT e quais dissidências isso tem gerado

Para o advogado trabalhista Romero Paim, o principal motivo para a escolha de contratar PJs ao invés de um empregado formal são os encargos atribuídos ao empregador. “Existe um regramento relativo à proteção do trabalhador estabelecido na CLT, como pagamento de FGTS, férias remuneradas, licença-maternidade, entre outros”, explica o especialista. Tais encargos são inexistentes nos contratos de pessoas jurídicas.

As leis trabalhistas presumem a hipossuficiência do empregado em relação ao empregador, ou seja, consideram que o trabalhador possui menos poder nas tratativas entre as duas partes. “Essa consideração traz uma série de facilitadores ao empregado, como inversão do ônus da prova na esfera trabalhista, quando é o empregador quem tem o ônus de provar seu ponto perante o juiz do trabalho, sendo presumido que o empregado ‘fala a verdade’ onde não se provou o contrário”, esclarece Paim.

Segundo especialista, empregadores buscam 'driblar' a CLT ao contratarem PJs para não lidar com encargos trabalhistas, o que tem gerado uma série de ações trabalhistas contra empresas - Foto: Freepik/ND

Segundo especialista, empregadores buscam ‘driblar’ a CLT ao contratarem PJs para não lidar com encargos trabalhistas, o que tem gerado uma série de ações trabalhistas contra empresas – Foto: Freepik/ND

Ao se fazer uma pejotização, o intuito é tentar estabelecer uma “igualdade” entre patrão e empregado, derrubando a série de facilidades atribuídas ao trabalhador. “Há também uma economia financeira para o empregador, já que não seriam devidos à empresa os direitos trabalhistas. É importante ressaltar que, apesar dos direitos que o pejotizado perde ao assumir esse tipo de vínculo, por norma, as obrigações se impõem pelo próprio poder hierárquico do empregador”, salienta o advogado.

Por que as ações trabalhistas sobre pejotização têm crescido na Justiça

O número de ações trabalhistas tem crescido nos últimos anos por conta da pejotização. Segundo Paim, muitos trabalhadores reclamam que seus direitos trabalhistas não são pagos pelas empresas que os contratam como PJ, apesar de realizarem funções que caracterizam vínculo empregatício.

Para cada caso pode existir um entendimento diverso, dada as especificidades de cada trabalho. As divergências entre decisões da Justiça do Trabalho e o entendimento do STF se dão na interpretação da presença dos requisitos de emprego, explica o especialista.

A existência de vínculo empregatício é prevista em lei, mas a sua aplicação ainda é debatida. “Segundo a CLT e a doutrina, para ser reconhecida a existência de relação de emprego, e, por consequência, todos os direitos trabalhistas dela decorrentes, são necessárias a presença pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação”, analisa Paim.

“Também é importante esclarecer que no direito trabalho, impera o princípio da primazia da realidade. Isso significa que, para o juiz, o que vale é o que de fato acontece, sendo que o fato prevalece sobre o documentado”, acrescenta.

Definição sobre o que configura ou não um vínculo empregatício é debate recorrente nas milhões de ações trabalhistas que tramitam no país, explica advogado - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND

Definição sobre o que configura ou não um vínculo empregatício é debate recorrente nas milhões de ações trabalhistas que tramitam no país, explica advogado – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND

Ainda é possível para entrar com ações trabalhistas sobre pejotização após a suspensão? Advogado explica detalhes

A suspensão da tramitação das ações trabalhistas relacionadas à pejotização não significa que novos processos não podem ser gerados. No entanto, será necessária maior paciência para que elas andem na Justiça.

Para o especialista, a consulta com um advogado é importante antes de se acionar a Justiça. “Cada caso tem suas especificidades e é sempre necessário consultar um profissional para avaliação dos riscos e da possibilidade de êxito, independente da demanda jurídica”, recomenda Paim.

Apesar da suspensão das ações trabalhistas até o competente julgamento, o especialista alerta que existe um período a ser respeitado por aqueles que buscam ingressar com uma ação judicial, seja na Justiça comum ou trabalhista, sob pena de haver prescrição ou decadência do direito que se pretende reclamar.

“Para que se possa reclamar os direitos trabalhistas e comprovar a existência da prática da pejotização perante a Justiça do Trabalho, é necessário que a ação competente seja distribuída antes que se complete 2 anos a contar do fim do vínculo com o empregador, conforme dispõe o artigo 11 da CLT”, conclui Paim.

 

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