‘Novo mundo’ de Arnaldo Antunes somente engrena em cena quando o cantor recorre aos velhos sucessos


Requintado visualmente, show peca pelo roteiro mal estruturado que prejudica a fruição do inédito repertório do vigoroso álbum lançado em março. Arnaldo Antunes na estreia nacional da turnê do show ‘Novo mundo’ no Circo Voador (RJ), no Festival Queremos! 2025
Karyme França / Miolo Filmes / Divulgação Festival Queremos!
♫ OPINIÃO SOBRE SHOW
Título: Novo mundo
Artista: Arnaldo Antunes
Data e local: 11 de abril de 2025 no Circo Voador (Rio de Janeiro, RJ)
Cotação: ★ ★ ★
♬ Foi somente quando A casa é sua (2009) entrou no roteiro do show estreado por Arnaldo Antunes no Circo Voador, palco mais caloroso do Rio de Janeiro (RJ), que o público se sentiu realmente em casa e fez coro ardoroso com o artista no canto desta parceria com Ortinho lançada por Arnaldo no álbum Iê Iê Iê (2009).
Só que A casa é sua já era a 16º das 24 músicas do roteiro do show Novo mundo, cuja turnê – baseada no álbum homônimo lançado pelo cantor e compositor paulistano em 20 de março – teve o pontapé inicial na noite de ontem, 11 de abril, dentro da programação do Festival Queremos! 2025, em apresentação que somente engrenou no terço final quando Arnaldo recorreu aos velhos hits.
Nessa parte final, cujos sucessos beneficiaram a fruição das duas novíssimas parcerias de Arnaldo com David Byrne e do samba-rock Tanta pressa pra quê? (Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, 2025), a música Socorro (Arnaldo Antunes e Alice Ruiz, 1994) atiçou o público que pareceu nada sentir no início do show, O pulso (Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Bellotto, 1989) ainda pulsou e a canção tribalista Passe em casa (Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Marisa Monte e Margareth Menezes, 2002) surtiu efeito catártico na plateia.
Sem falar no bis em que o grito “Sem anistia” ecoou forte em coro espontâneo da plateia (e endossado por Arnaldo), precedendo o rock punk Fora de si (1995) e abrindo o apetite popular para Comida (Arnaldo Antunes, Marcelo Frommer e Sergio Britto, 1987). Arnaldo virou o jogo no segundo tempo.
Visualmente, o show Novo mundo primou pelo requinte, em especial o da iluminação. O efeito das luzes sobre os figurinos – com Arnaldo vestido de branco em contraponto com o preto das roupas dos músicos – resultou belo, merecendo menção honrosa o manto brilhante portado pelo artista durante o canto de Debaixo d’água (2009).
A julgar pela estreia da turnê Novo mundo, o problema do show está sobretudo na disposição das músicas no roteiro.
Merece ser louvado o artista que, ao lançar um álbum com músicas inéditas, apresenta em cena todo o repertório desse disco. Só que Arnaldo não levou em consideração que o álbum Novo mundo ainda é muito recente e que ainda não foi absorvido pelo público. Se Arnaldo tivesse estreado a turnê em um teatro, talvez tivesse se dissipado a apatia observada na apresentação de músicas como É primeiro de janeiro (Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, 2025).
Em show apresentado em festival ou em casa em que o público em maioria fica na pista, é preciso contrabalançar o repertório inédito com músicas mais conhecidas para equilibrar o roteiro – cuidado que Arnaldo não teve ao inserir composições menos conhecidas e menos aliciantes, como Cultura (1993), Muito muito pouco (2013) e Se assim quiser (Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, 2004), no meio das músicas novas ao longo da primeira metade.
Para piorar o quadro inicial, o repertório do álbum Novo mundo não chegou à cena com a pegada do disco produzido por Pupillo Oliveira com sonoridade nervosa que revigorou o som de Arnaldo Antunes. Algo se perdeu na transposição do disco para o palco. Tanto que a presença de um guitarrista de forte assinatura como Kiko Dinucci – presente luxuosa na banda formada por músicos do naipe de Curumin (bateria), Betão Aguiar (baixo) e o virtuose Vitor Araújo (piano e sintetizador) – demorou a ser notada em cena.
E o fato é que músicas como Novo mundo (2005) – número que evidenciou já na abertura do show a presença performática de Arnaldo em cena – e Tire o seu passado da frente (2025) soaram sem o peso do álbum, assim como as baladas, a exemplo da canção de amor Acordarei (2025), não reverberaram com toda a delicadeza do disco.
Algo soou tão fora da ordem nessa metade inicial do show que até ficou difícil reconhecer de imediato Busy man (Sem você). Arnaldo cantou mal a parceria com Carlinhos Brown apresentada por Brown no álbum Omelete man (1998).
A questão não é cobrar do artista um show preguiçoso para todo mundo cantar junto no estilo karaokê – e cabe ressaltar que o hit tribalista Já sei namorar (Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte, 2002) cumpriu essa função na desanimada primeira metade do show – mas apontar um desequilíbrio no roteiro.
Se mais bem estruturado, o roteiro do show Novo mundo pode facilitar a fruição do repertório inédito e impedir espectadores que gritem algo na linha “socorro, não estou sentindo nada”.
Arnaldo Antunes segue roteiro sem equilíbrio, mas vira o jogo ao fim do show ‘Novo mundo’
Patricia Burlamaqui / Divulgação Circo Voador
♪ Eis as 24 músicas do roteiro seguido por Arnaldo Antunes em 11 de abril de 2025 na estreia nacional do show Novo mundo no Circo Voador, na cidade do Rio de Janeiro (RJ):
1. Novo mundo (Arnaldo Antunes, 2025)
2. O amor é a droga mais forte (Arnaldo Antunes, 2025)
3. Muito muito pouco (Arnaldo Antunes, 2013)
4. É primeiro de janeiro (Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, 2025)
5. Se assim quiser (Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, 2004)
6. Busy man (Sem você) (Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 1998)
7. Viu, mãe? (Arnaldo Antunes e Erasmo Carlos, 2025)
8. Já sei namorar (Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte, 2002)
9. Pra não falar mal (Arnaldo Antunes, 2025)
10. Debaixo d’água (Arnaldo Antunes, 2001)
11. Acordarei (Arnaldo Antunes, 2025)
12. Lágrimas no mar (Pedro Baby, João Moreira, Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, 2021)
13. Tire o seu passado da frente (Arnaldo Antunes, 2025)
14. Cultura (Arnaldo Antunes, 1993)
15. Pedido de casamento (Arnaldo Antunes, 2004)
16. A casa é sua (Arnaldo Antunes e Ortinho, 2009)
17. Body corpo (Arnaldo Antunes e David Byrne, 2025)
18. Não dá para ficar parado aí na porta (Arnaldo Antunes e David Byrne, 2025)
19. O pulso (Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Bellotto, 1989)
20. Socorro (Arnaldo Antunes e Alice Ruiz, 1994)
21. Tanta pressa pra quê? (Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, 2025)
22. Passe em casa (Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Marisa Monte e Margareth Menezes, 2002)
Bis:
23. Fora de si (Arnaldo Antunes, 1995)
24. Comida (Arnaldo Antunes, Marcelo Frommer e Sergio Britto, 1987)
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