
De origem quilombola, capixaba Lorena Pires, de 25 anos, vai passar dois ano na capital francesa se apresentando com uma das mais tradicionais óperas do mundo. Capixaba é a primeira brasileira na academia de ópera de Paris
O Brasil tem a primeira cantora lírica integrando a Academia de Ópera de Paris, um dos programas mais importantes do ramo na França. A nova residente da instituição musical é Lorena Pires, de 25 anos, natural de Vitória, no Espírito Santo, e de origem quilombola.
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A notícia chegou à Lorena no dia 25 de fevereiro. Dentro de casa, ao receber o e-mail da companhia musical, o choro foi a primeira reação de capixaba. Mas, para ela, a “ficha” demorou dois dias para cair.
“Eu estava em casa, no computador, e recebi uma notificação de um e-mail que chegou pra mim pelo tablet e eu já conhecia a pessoa [que enviou o e-mail]. E aí eu olhei estava: ‘nós estamos felizes de receber você como artista residente da temporada’. Eu fiquei sem acreditar e comecei a chorar”, disse a soprano.
Para conseguir uma das duas vagas, Lorena disputou com outros 20 concorrentes. A soprano ingressou no programa de estágio também na Ópera de Paris, intermediado pela Fábrica de Óperas da UNESP, celebrando o Ano França-Brasil.
Lorena também vai participar dos espetáculos operísticos e concertos realizados e promovidos pela Ópera de Paris.
A capixaba esteve em Paris em dezembro do ano passado durante um intercâmbio. No dia 23 de março, ela retorna à capital francesa deve permanecer dois anos por lá.
Assim como outros artistas contratados, a capixaba vai receber treinamento com profissionais importantes do meio artístico.
Quando voltar à França, Lorena vai passar a se preparar para apresentações do concerto “Melodias francesas e melodias brasileiras”.
O evento acontece no Amphithéâtre Olivier Messiaen, na Opéra Bastille, uma das casas da Ópera de Paris. A mesma apresentação irá acontecer no dia 11 de abril, na embaixada do Brasil na cidade europeia.
Capixaba Lorena Pires é a primeira cantora lírica brasileira a integrar a Ópera de Paris
Vinícius Jardim/Divulgação/Lorena Pires
Amor desde criança
A jovem artista já era ligada à música desde criança, mas entrou no mundo erudito e clássico aos 16 anos.
A trajetória começou quando, ao fazer aulas de canto na capital capixaba, ela conheceu professoras de canto lírico.
As professoras apresentaram o universo que envolve o gênero artístico e Lorena se encantou pela performance e os figurinos das óperas, que se tornaram uma grande paixão — o que a levou à faculdade de Música.
Conservatório
Lorena ingressou, em 2020, no Canto Erudito da Faculdade de Música do Espírito Santo (Fames). Ali, o caminho só estava começando para a soprano capixaba.
Em 2023, ela se formou no conservatório e foi destaque no Festival de Música Erudita do Espírito Santo.
Cantora lírica Lorena Pires deve passar dois anos na França em estágio na Ópera de Paris
Vinícius Jardim/Divulgação/Lorena Pires
No mesmo ano, venceu o concurso Joaquina Lapinha, na cidade de Tatuí, em São Paulo, e se apresentou em um concerto no Teatro Municipal no estado paulista.
Agora, com a mudança para a Europa, a soprano considera surreal estar vivendo tantos sonhos.
“Porque uma coisa é você ser uma pessoa obstinada e ir lá e tentar escancarar as portas. Outra é ver seus sonhos se concretizando. Eu não acreditei e chorei muito muito muito”
Racismo
Lorena conta, apesar de viver a melhor fase da carreira, o preconceito quase a fez desistir do sonho de ser artista.
Ataques racistas sofridos na infância quase silenciaram a voz de Lorena. Quando menina, ela só cantava dentro de casa, muitas vezes sozinha, quando muito com alguma amiga por perto.
Ao crescer, a música continuou no coração, mas ela tentou se convencer a seguir outros caminhos.
“E fui tentando encontrar em outras áreas, mas a música me puxou de uma forma que não tinha como eu recusar. Não teve jeito, quando você tem esse chamado da música não tem como você correr. Acho que para o artístico é muito difícil não ser artista. Você arruma alguma maneira de ser”
Ao chegar aos palcos, Lorena chegou a pensar que havia superado todas as barreiras colocadas pelo racismo, mas logo se deu conta de que os bastidores continuam perpetuando o preconceito.
“Já dentro desse meio e do mercado, já vivenciei experiências de racismo, de alguém vir me perguntar se eu estava ali para limpar o camarim. Uma bem recente também, de eu estar sentada em um assento e virarem pra mim e falar ‘não, aqui é só assento para os cantores’ e tinha vários outros cantores e eu fui a única pessoa questionada”, contou Lorena.
“São muitas sutilezas que acontecem e você tem que se fortalecer pq se não vc acaba sucumbindo a dor do racismo e é muito complicado”, falou Lorena.
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