Entenda se há riscos em caso de contato com amostras de urânio enriquecido que sumiram na INB


Ampolas com material em estado gasoso desapareceram da unidade de Resende. Urânio enriquecido é usado no processo de geração de energia elétrica em usinas nucleares e na criação de bomba atômica. O sumiço de duas ampolas com amostras de urânio enriquecido nas Indústrias Nucleares do Brasil (INB), em Resende, no Sul do Rio de Janeiro, levanta uma questão: há algum tipo de risco em caso de contato?
Segundo a INB, cada recipiente extraviado tem oito centímetros de comprimento e contém pequena quantidade (oito gramas) de hexafluoreto de urânio (em estado gasoso), enriquecido a 4,25% (U-235), em uma fase do processo antes de virar pastilha para ser utilizado na produção de energia nas usinas nucleares de Angra dos Reis (RJ).
Tamanho da ampola com urânio
Divulgação/INB
Procuradas pelo g1, a INB e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEM), que regula a produção de energia nuclear no Brasil, garantiram que não há riscos de contaminação radiológica em caso de contato com o material contido nas ampolas.
“É uma quantidade muito ínfima. Oito gramas não são nada. Em termos práticos, a ampola não serve para nada, a não ser que tenha um interesse laboratorial”, explicou José Augusto Perrotta, doutor em tecnologia nuclear pela Universidade de São Paulo (USP).
No entanto, a CNEN alerta para os riscos de danos físicos localizados, como dermatite, em caso de contato.
“A natureza e quantidade de material presente nas ampolas permitem afirmar que a liberação do conteúdo não acarreta danos radiológicos à saúde de um indivíduo. No entanto, cabe informar a possibilidade de risco químico associado à natureza tóxica dos compostos presentes, que podem provocar danos físicos localizados, informou a CNEN.
Polícia Federal busca responsáveis
INB e PF investigam sumiço de ampolas com amostra de urânio enriquecido em Resende
As ampolas desapareceram em julho deste ano. A INB percebeu o extravio dos tubos após uma transferência interna entre áreas de armazenamento na Fábrica de Combustível Nuclear e notificou a CNEN, que orientou a empresa a realizar uma varredura em toda a unidade.
“Ao esgotar as ações internas de buscas no interior das áreas supervisionadas e controladas, escritórios e, principalmente, no trajeto percorrido para transferência dos recipientes, além de outras áreas da unidade, a INB comunicou o ocorrido ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI-PR) e à Polícia Federal”, esclareceu a CNEN.
Ao g1, a Polícia Federal informou que foi notificada na quarta-feira (16) e “iniciará diligências para apurar as circunstâncias do fato e identificar eventuais responsáveis”.
De combustível a arma nuclear
O urânio encontrado em sua forma natural não produz energia. O processo de enriquecimento é realizado para separar e aumentar a concentração de um dos isótopos do urânio (U-235), que sofre um processo de fissão nos núcleos dos reatores nucleares.
A INB produz urânio enriquecido a até 5% em peso do isótopo 235 (U-235) para a fabricação dos combustíveis que abastecem as usinas Angra 1 e Angra 2 e, no futuro, também Angra 3.
Usinas Angra 2 (à esquerda) e Angra 1 (à direita); os reatores, onde a energia nuclear é gerada, ficam dentro das estruturas brancas
Eletronuclear
O urânio de concentração de pelo menos 20% é normalmente utilizado para pesquisas. Já o urânio com 90% pode ser usado para a produção de armas nucleares.
O que é urânio
O urânio é um mineral encontrado nas rochas da crosta terrestre. Segundo a INB, no Brasil, a única mina em atividade está localizada em Caetité, na Bahia, onde se encontram recursos minerais estimados em 87 mil toneladas.
Os átomos de urânio têm diversas variantes, chamadas de isótopos. Todas elas têm o mesmo número de prótons no núcleo, mas diferentes números de nêutrons. O urânio encontrado na natureza tem uma concentração de 99,27% da variante chamada U-238 e 0,72% da variante U-235.
Urânio
Divulgação/INB
Ciclo do combustível nuclear
Ciclo do combustível nuclear
Divulgação/INB
O ciclo do combustível nuclear começa na Unidade de Concentração de Urânio em Caetité (BA), com a transformação do urânio em um material particulado.
Depois, essas partículas passam por um processo químico que separa o urânio de outros materiais associados a ele na natureza. O resultado deste processo é o concentrado de urânio (yellowcake), que é dissolvido e purificado.
Yellowcake
Getty Images/BBC
O resultado deste material é armazenado em tambores especiais e segue para a etapa de conversão, onde o líquido é convertido do estado líquido para o gasoso, formando o hexafluoreto de urânio (UF6). Essa etapa acontece fora do Brasil.
Quando finalmente chega à forma de gás, o urânio é trazido para a Fábrica de Combustível Nuclear da INB em Resende e vai para a fase do enriquecimento. Foi nesta etapa do urânio em estado gasoso que as amostras desapareceram.
Nesta etapa, o urânio é colocado em diversas ultracentrífugas para separar e aumentar a concentração do isótopo U-235, que sofre um processo de fissão nos núcleos dos reatores nucleares.
A concentração do isótopo U-235 passa de 0,7%, como é encontrado na natureza, para até 5% (suficiente para a geração de energia nos reatores nucleares).
Pastilhas de urânio
Marcelo Côrrea/Divulgação/INB
Já enriquecido, ainda em Resende, o gás é reconvertido em pó de dióxido de urânio (UO2) e transformado em pequenas pastilhas que são levadas para as usinas de Angra dos Reis, onde ocorre a fissão dos átomos de urânio.
É quando é gerado o calor e o aquecimento da água, que é transformada em vapor que faz movimentar as turbinas para geração de energia elétrica.
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